Foto colhida na NET
O que você faria se descobrisse ser portador de uma doença terminal, capaz de lhe permitir viver apenas por alguns pares de dias? (Essa pergunta é para todos que por aqui passarem)
Amaro, um certo personagem, habitante em uma certa cidade de um certo país, fez essa descoberta ao receber o resultado de uma doação ao Banco de Sangue local. À simples menção de que havia qualquer coisa fora do normal, ele foi sentindo a vista escurecer, o mundo girar e formigamentos nas pernas. Depois de tomar um café forte e sentir as forças retornando, diante de inexorável realidade, resolveu que iria aproveitar bem o pouco tempo que restava. Para ele, o que seria aproveitar bem? Sendo, desde sempre, um cara pacato, reservado, tímido, calado, quieto, quase invisível mesmo, pensou que seria bom mudar de temperamento. Nesses últimos dias de vida... Iria ser um outro Amaro.
No pacote das mudanças, no topo da lista, constava a sinceridade. De então em diante, diria o que viesse à cabeça, sobre tudo e todos. Também tinham os dias contados aquela postura subserviente de sempre, pusilânime. Aquela mania de se sentir “o último dos homens”. E sentenciou: nunca mais vou servir de chacota para os companheiros de trabalho, vizinhos e conhecidos. Sim, partiria de cabeça erguida, sem levar nenhum tipo de desaforo pra casa (ou pro túmulo, melhor dizendo).
Na manhã seguinte, logo ao colocar os pés fora de casa, disse ao vizinho que o achava insuportavelmente incomodativo e que detestava o gosto musical do camarada. Ao se dirigir para o carro, recebeu uma ligação, ao celular, da moça com quem tivera um encontro fazia alguns dias, a quem revelou que até era boazinha de cama, mas que precisava “caprichar geral” no sexo oral. Chegando ao trabalho, resolveu estacionar na vaga do seu chefe. Quando o próprio veio lhe pedir para retirar o veículo, disse-lhe, aos berros, que não saía, pois não havia ali ninguém melhor do que ele, e que ali iria permanecer.
Os ataques de sinceridade extrema foram se replicando ao longo do dia, até que recebeu uma ligação do laboratório de exames, na qual uma voz quase sumida lhe pediu imensas desculpas por um engano ocorrido na troca de resultados. Enfim, não era ele, e sim outro quem tinha para viver os seus últimos dias de vida.
Debalde. O estrago já havia sido consumado. Naquele momento, parecia que o mundo caia sobre sua cabeça. E, diante da realidade, não podia voltar a ser o velho Amaro. Muito menos o novo.
Às vezes, sinceridade em demasia pode causar efeitos irreversíveis. (Essa orientação vai para um determinado anônimo que, como o Amaro, páira entre ser tratado como invisível e entre ser alguém desagradável e pesado).